Dois times. Os jogadores usam joelheiras e luvas e se locomovem com os braços e joelhos apoiados no chão. As equipes avançam pela quadra, passando a bola de mão em mão até atingir o gol adversário. Praticado no Centro Integrado de Educação Pública (CIEP) Pedro Paulo Corrêa de Sá, no Rio de Janeiro, o Felipebol — como foi nomeado esse inusitado jogo — é um esporte criado pelos próprios estudantes da escola para permitir a inclusão nas aulas de educação física de um colega com limitações motoras causadas por uma paralisia cerebral. O esporte deu tão certo que continuou no CIEP, mesmo depois da saída de Felipe, e migrou para a nova instituição de ensino em que o jovem ingressou.
O Felipebol foi um dos muitos resultados positivos do projeto “Portas abertas para a inclusão — Educação física inclusiva” nos últimos anos. A iniciativa nasceu de uma parceria entre o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), a Fundação FC Barcelona e o Instituto Rodrigo Mendes (IRM), e começou em 2012 com o objetivo de formar educadores de diversas regiões do Brasil para apoiar a promoção da inclusão escolar de meninas e meninos com deficiência por meio de práticas esportivas seguras. Dessa maneira, o “Portas abertas” dialoga com as garantias dos direitos humanos desse público expressos na Constituição brasileira e com a Convenção sobre Direitos das Pessoas com Deficiência bit.ly/convencao-onu , aprovada na ONU em 2006 e ratificada pelo Brasil em 2008.
“Ao contribuir para a garantia dos direitos das crianças com deficiência, o ´Portas abertas´ contribui também para que o Brasil efetive a Convenção sobre os Direitos da Criança, da qual é signatário. Segundo a convenção, é dever do País garantir que cada uma dessas crianças possa desfrutar de uma vida plena e decente em condições que garantam sua dignidade, favoreçam sua autonomia e facilitem sua participação ativa na comunidade”, defende Gary Stahl, representante do UNICEF no Brasil.
Até 2013, Felipe dos Santos era um aluno apenas integrado bit.ly/modelo-integracao, inserido no contexto escolar sem que suas características ou necessidades fossem levadas em conta. Da cadeira de rodas, ele participava de algumas atividades na quadra, mas não de maneira completa, apesar de sentir muita vontade de jogar futebol com os amigos da classe. Ele frequentava nesse período o 5o ano do CIEP Pedro Paulo Corrêa de Sá, na cidade do Rio de Janeiro. Essa realidade começou a mudar quando a escola participou do “Portas abertas”.
Com os saberes adquiridos durante a formação bit.ly/formacao-educadores, os educadores passaram a ficar atentos às singularidades de Felipe, notando a presença de calos em suas mãos e joelhos. Luiz Gustavo Firmino, professor de educação física da escola, contou: “Quando questionado sobre as marcas, ele nos respondeu que, quando estava em casa, não gostava de usar a cadeira de rodas e preferia se arrastar pelo chão”. A partir dessa troca de ideias, o educador passou a experimentar, com toda a turma, formas de explorar os movimentos que o estudante podia realizar. Após muitas tentativas e erros, um jogo que poderia ser praticado por todos foi criado.
Para Luiz Henrique Conceição, coordenador do IRM, o Felipebol é paradigmático: “A atividade é muito simples, todos passam a ter a mesma condição de prática do esporte. No entanto, o mais interessante aqui é que foram os estudantes que falaram com o professor. Eles protagonizaram o processo, assumiram e pediram para o colega participar: ‘vamos fazer desse jeito’, e mobilizaram todo o grupo.” Mais que isso, a iniciativa teve continuidade no CIEP, onde cerca de 2% dos quase 800 alunos possuem algum tipo de deficiência. E o Felipebol acompanhou Felipe que, ao ser matriculado em uma outra escola, passou a compartilhar o esporte ensinando aos novos professores e colegas.
Para ler mais, acesse o DIVERSA bit.ly/felipebol.
Os megaeventos sediados no país nos últimos anos — como a Copa do Mundo FIFA 2014 e os Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016 — impulsionaram a criação e a ampliação do projeto “Portas abertas”, respectivamente. “O projeto, entretanto, vai além desse cenário esportivo na medida em que seus realizadores acreditam que o esporte e as atividades físicas podem ser ferramentas de inclusão de estudantes que são usualmente deixados de fora do cotidiano escolar”, diz Ítalo Dutra, chefe da área de educação do UNICEF. Tais ferramentas têm o potencial de aumentar o interesse dos alunos pela escola e melhorar seu desempenho de uma forma geral.
O relato de Rosemary Sousa, cursista do projeto em Belo Horizonte (Minas Gerais), ilustra de forma clara esse ponto: “Na socialização, a felicidade no rosto durante a participação das crianças já dizia tudo. Quando sentimos que fazemos parte de algo, que podemos ser também atores, sentimos que podemos tudo!”. Além disso, depoimentos apontam o avanço no desenvolvimento cognitivo dos estudantes. Dalvani Câmara, cursista de Natal (Rio Grandes do Norte), contou: “Os alunos com deficiência tiveram uma aprendizagem muito significativa, pois passaram a participar mais ativamente não só das aulas de educação física mas de todas as disciplinas”.
O objetivo do “Portas abertas” é, por fim, apoiar redes públicas de educação para a garantia de acesso, permanência, aprendizagem e conclusão do ensino de estudantes com deficiência1 (crianças e adolescentes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação) na educação infantil e ensino fundamental, por meio da ressignificação da educação física.
Assim, em 2016, mais de 43 mil alunos, professores, gestores, familiares, entre outras pessoas envolvidas, foram diretamente beneficiados pelos projetos locais de intervenção, criados e implementados em 16 cidades pelos cursistas do “Portas abertas”.
Esse relatório faz parte do conjunto de materiais desenvolvidos com a finalidade de compartilhar o conhecimento nos âmbitos nacional e internacional. São eles uma Coletânea de práticas, também disponível em formatos PDF e HTML, e vídeos que detalham 12 experiências e seus pontos mais importantes, apresentando as atividades desenvolvidas em algumas das cidades visitadas. Todas as publicações do “Portas abertas” estão disponíveis nos sites: rm.org.br/portas-aberta e unicef.org.br.
O “Portas abertas” não encerrou sua atuação com o fim dos megaeventos sediados no Brasil nos últimos anos. Pelo contrário, configura-se como um verdadeiro legado social, ganhando novas possibilidades de atuação e fortificando-se como um projeto que já impactou 91.954 estudantes desde sua primeira edição.
Em 2016, o “Portas abertas” desdobrou-se em uma exposição fotográfica que ilustra, nas lentes de Pat Albuquerque, cenas de alguns dos projetos desenvolvidos pelos cursistas ao longo do projeto. A itinerância começou durante os Jogos Paralímpicos Rio 2016, no evento organizado pelo UNICEF Brasil e Consulado Britânico no Rio de Janeiro, com o seminário “Quando todos jogam juntos, todos ganham”, realizado na Casa Paralímpica Britânica (British House). Com a participação do embaixador britânico Alex Ellis e do representante do UNICEF no Brasil, Gary Stahl, o evento reuniu 150 professores, paratletas, parceiros do poder público e da sociedade civil em torno da temática sobre inclusão, esporte e brincar.
Na ocasião, Rodrigo Hübner Mendes apresentou resultados e histórias do “Portas abertas”, convidando ao palco dois ex-cursistas e professores no Rio de Janeiro — Antônio Carlos de Souza e Luiz Gustavo Firmino. Ambos contaram seus projetos de inclusão por meio da educação física na Escola Municipal Floriano Peixoto e no CIEP Padre Paulo Correa, respectivamente. No encerramento do seminário, os participantes foram convidados a conhecer a exposição no terraço da British House.
Da sede dos Jogos Rio 2016, a exposição viajou para o Museu do Futebol, em São Paulo (SP). Nesse espaço, cerca de 60 mil visitantes puderam interagir com o projeto, que disponibilizou um audioguia especial e um totem multimídia com 12 vídeos em formato regular, com legendas em inglês, e suas versões com recursos de acessibilidade: Libras e audiodescrição.
Transpondo fronteiras para disseminar as possibilidades de transformação que o esporte possui, em outubro de 2016, o superintendente do IRM participou do World Forum on Sport and Culture, realizado pelo World Economic Forum, em Tóquio (Japão). Em sua apresentação no painel “O impacto transformador do esporte” bit.ly/impacto-esporte, fez referências ao projeto “Portas abertas” e às experiências dos Jogos Paralímpicos no Brasil 2016, propondo avanços para a concepção dos Jogos Tokyo 2020.
A formação do “Portas abertas” foi realizada a partir de um modelo semipresencial: as aulas semanais eram transmitidas ao vivo pela internet para os cursistas, que se reuniam presencialmente nos polos. Entretanto, os principais pontos citados nos depoimentos de quem participou do curso mostram que o “Portas abertas” foi muito além da sala de aula em que os encontros aconteciam. Ao longo do processo formativo, os participantes eram convidados a criar um grupo de trabalho para construir uma mudança significativa em sua realidade escolar.
Durante todo o curso, os professores e as tutoras responsáveis pelas aulas e acompanhamento dos cursistas reforçam o quão importante é aproveitar ao máximo os horários de encontros coletivos para buscar trabalhos conjuntos e projetos que impactem toda a unidade escolar. Elizabeth Parente, cursista de Brasília (Distrito Federal), disse: “Não basta ao professor um cabedal de conhecimentos se ele não atuar na realidade da escola”.
Para chegar a esse resultado, os grupos de cursistas são convidados a realizar um diagnóstico sobre a realidade de sua escola. Com base nesse retrato, planejam e implementam ações pedagógicas que explorem a educação física como uma linguagem que pode favorecer a inclusão na escola comum. O debate não se remete ao esporte de alto rendimento nem à abordagem esportivista: promove a discussão sobre como ressignificar as modalidades existentes e, quando possível, estimula a criação de atividades físicas inéditas. As ações dos profissionais impactaram, em 2016, 32.325 estudantes das redes públicas de ensino.
O processo de formação é dividido em três etapas de trabalho.
1. Mobilização e estruturação:nessa etapa, foi feita a articulação com as secretarias municipais e realizado um encontro presencial com representantes das instituições, em São Paulo, capital. Os profissionais participantes são denominados como interlocutores e facilitadores, e receberam, durante a visita, orientações gerais sobre o projeto “Portas abertas”, formação específica sobre o ambiente virtual de aprendizagem (AVA) e sobre os papéis que exercerão ao longo das etapas seguintes.
foi realizado um curso de formação continuada sobre educação física inclusiva, envolvendo professores, gestores de escolas municipais e técnicos de secretarias de educação em 19 polos nas 16 cidades participantes do projeto. A programação do curso envolveu 20 aulas, transmitidas ao vivo pela internet a partir de um modelo semipresencial de ensino. As aulas foram promovidas pela equipe do Instituto Rodrigo Mendes, especialistas de renome (tanto da academia quanto do poder público), além de representantes ativos da sociedade civil.
Com o objetivo de enriquecer o conteúdo e contribuir para a assimilação das aulas teóricas, foram realizadas diversas atividades complementares. Lailla Micas, assistente de formação do IRM, reforçou: “As aulas online e todo material de apoio do curso servem como conhecimento para a vivência da educação inclusiva ao longo de toda a prática profissional do educador”. Todo esse conhecimento se torna base para os cursistas elaborarem e executarem os projetos locais. Paralelamente, a equipe do IRM promoveu o monitoramento dos projetos e fornece apoio técnico aos cursistas.
3. Encontros locais:após a conclusão da formação continuada e da implementação dos projetos locais, foram realizados encontros de encerramento em todas as cidades participantes. Neles, os cursistas apresentaram os resultados dos projetos locais que criaram e foram convidados a continuar compartilhando suas experiências na comunidade DIVERSA. Essa etapa teve como objetivo promover a troca de experiências e formar redes de construção de conhecimento sobre a educação física inclusiva.
O curso de formação do “Portas abertas para a inclusão — Educação física inclusiva”, desenvolvido no período de março a novembro de 2016, teve 509 cursistas2 em 15 capitais brasileiras e em Belford Roxo (RJ). A composição das turmas priorizou a heterogeneidade, envolvendo professores, gestores de escolas, técnicos das secretarias de educação e outros profissionais, conforme tabela abaixo.
Cursistas por perfil | |
Coordenador(a) pedagógico(a) | 30 |
Diretor(a) | 27 |
Atendimento educacional especializado | 76 |
Professor(a) de educação física | 143 |
Professor(a) de outras disciplinas | 2 |
Professor(a) regentes | 29 |
Profissionais de apoio | 5 |
Técnicos da secretaria municipal | 24 |
Universitários(as) | 3 |
Outros | 8 |
Total geral | 347 |
Já o impacto direto do “Portas abertas”, resultante de 119 projetos locais, foi de 43.528 pessoas. Dentre elas, 32.325 (74,2%) eram estudantes das redes públicas de ensino, sendo 2.163 estudantes com deficiência.
DIRETORES(AS) | 562 | 1,3% | |
COORDENADORES(AS) | 293 | 0,7% | |
PROFESSORES(AS) DE EDUCAÇÃO FÍSICA | 333 | 0,8% | |
ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO | 170 | 0,4% | |
PROFESSORES(AS) DE OUTRAS DISCIPLINAS | 1.691 | 3,9% | |
PROFISSIONAIS NÃO DOCENTES | 900 | 2,1% | |
ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA | 2.163 | 5,0% | |
OUTROS ESTUDANTES | 30.162 | 69,5% | |
FAMILIARES | 7.154 | 16,5% | |
Total | 43.528 | 100% |
Participantes | |
Coordenador(a) pedagógico(a) | 30 |
Diretores(as) | 8 |
Coordenadores(as) | 18 |
Professores(as) de educação física | 5 |
Atendimento educacional especializado | 14 |
Professores(as) de outras disciplinas | 56 |
Profissionais não docentes | 25 |
Estudantes com deficiência | 58 |
Outros estudantes | 615 |
Familiares | 75 |
Total geral | 874 |
Participantes | |
Diretores(as) | 7 |
Coordenadores(as) | 16 |
Professores(as) de educação física | 16 |
Atendimento educacional especializado | 15 |
Professores(as) de outras disciplinas | 18 |
Profissionais não docentes | 34 |
Estudantes com deficiência | 39 |
Outros estudantes | 157 |
Familiares | 46 |
Total geral | 348 |
Participantes | |
Diretores(as) | 4 |
Coordenadores(as) | 5 |
Professores(as) de educação física | 2 |
Atendimento educacional especializado | 3 |
Professores(as) de outras disciplinas | 10 |
Profissionais não docentes | 22 |
Estudantes com deficiência | 7 |
Outros estudantes | 145 |
Familiares | 43 |
Total geral | 241 |
Participantes | |
Diretores(as) | 7 |
Coordenadores(as) | 9 |
Professores(as) de educação física | 8 |
Atendimento educacional especializado | 4 |
Professores(as) de outras disciplinas | 69 |
Profissionais não docentes | 18 |
Estudantes com deficiência | 88 |
Outros estudantes | 1.565 |
Familiares | 140 |
Total geral | 1.908 |
Participantes | |
Diretores(as) | 13 |
Coordenadores(as) | 11 |
Professores(as) de educação física | 20 |
Atendimento educacional especializado | 15 |
Professores(as) de outras disciplinas | 148 |
Profissionais não docentes | 143 |
Estudantes com deficiência | 60 |
Outros estudantes | 1.921 |
Familiares | 329 |
Total geral | 2.660 |
Participantes | |
Diretores(as) | 55 |
Coordenadores(as) | 45 |
Professores(as) de educação física | 75 |
Atendimento educacional especializado | 26 |
Professores(as) de outras disciplinas | 371 |
Profissionais não docentes | 120 |
Estudantes com deficiência | 146 |
Outros estudantes | 7.778 |
Familiares | 1.019 |
Total geral | 9.635 |
Participantes | |
Diretores(as) | 300 |
Coordenadores(as) | 18 |
Professores(as) de educação física | 14 |
Atendimento educacional especializado | 8 |
Professores(as) de outras disciplinas | 224 |
Profissionais não docentes | 102 |
Estudantes com deficiência | 149 |
Outros estudantes | 5.224 |
Familiares | 1.412 |
Total geral | 7.451 |
Participantes | |
Diretores(as) | 6 |
Coordenadores(as) | 6 |
Professores(as) de educação física | 9 |
Atendimento educacional especializado | 4 |
Professores(as) de outras disciplinas | 20 |
Profissionais não docentes | 15 |
Estudantes com deficiência | 31 |
Outros estudantes | 393 |
Familiares | 35 |
Total geral | 519 |
Participantes | |
Diretores(as) | 64 |
Coordenadores(as) | 95 |
Professores(as) de educação física | 91 |
Atendimento educacional especializado | 12 |
Professores(as) de outras disciplinas | 124 |
Profissionais não docentes | 42 |
Estudantes com deficiência | 1.002 |
Outros estudantes | 2.855 |
Familiares | 1.496 |
Total geral | 5.781 |
Participantes | |
Diretores(as) | 31 |
Coordenadores(as) | 26 |
Professores(as) de educação física | 16 |
Atendimento educacional especializado | 15 |
Professores(as) de outras disciplinas | 237 |
Profissionais não docentes | 105 |
Estudantes com deficiência | 153 |
Outros estudantes | 2.597 |
Familiares | 881 |
Total geral | 4.061 |
Participantes | |
Diretores(as) | 2 |
Coordenadores(as) | 1 |
Professores(as) de educação física | 15 |
Atendimento educacional especializado | 0 |
Professores(as) de outras disciplinas | 3 |
Profissionais não docentes | 3 |
Estudantes com deficiência | 26 |
Outros estudantes | 664 |
Familiares | 250 |
Total geral | 964 |
Participantes | |
Diretores(as) | 13 |
Coordenadores(as) | 7 |
Professores(as) de educação física | 9 |
Atendimento educacional especializado | 14 |
Professores(as) de outras disciplinas | 122 |
Profissionais não docentes | 98 |
Estudantes com deficiência | 118 |
Outros estudantes | 1.325 |
Familiares | 258 |
Total geral | 1.964 |
Participantes | |
Diretores(as) | 14 |
Coordenadores(as) | 7 |
Professores(as) de educação física | 19 |
Atendimento educacional especializado | 10 |
Professores(as) de outras disciplinas | 102 |
Profissionais não docentes | 57 |
Estudantes com deficiência | 110 |
Outros estudantes | 2.159 |
Familiares | 601 |
Total geral | 3.079 |
Participantes | |
Diretores(as) | 17 |
Coordenadores(as) | 11 |
Professores(as) de educação física | 11 |
Atendimento educacional especializado | 1 |
Professores(as) de outras disciplinas | 64 |
Profissionais não docentes | 59 |
Estudantes com deficiência | 41 |
Outros estudantes | 1.974 |
Familiares | 486 |
Total geral | 2.664 |
Participantes | |
Diretores(as) | 9 |
Coordenadores(as) | 7 |
Professores(as) de educação física | 9 |
Atendimento educacional especializado | 17 |
Professores(as) de outras disciplinas | 54 |
Profissionais não docentes | 24 |
Estudantes com deficiência | 44 |
Outros estudantes | 251 |
Familiares | 75 |
Total geral | 490 |
Participantes | |
Diretores(as) | 12 |
Coordenadores(as) | 11 |
Professores(as) de educação física | 14 |
Atendimento educacional especializado | 12 |
Professores(as) de outras disciplinas | 69 |
Profissionais não docentes | 33 |
Estudantes com deficiência | 91 |
Outros estudantes | 539 |
Familiares | 108 |
Total geral | 889 |
O Instituto Rodrigo Mendes possui um modelo conceitual que orienta suas ações em prol da educação inclusiva envolvendo princípios e dimensões da educação inclusiva. Começou a ser desenvolvido a partir de 2010 quando o centro de estudos do IRM passou a ganhar mais evidência e, desde então, se encontra em aprimoramento constante. O modelo foi elaborado a partir da análise de documentos considerados referências internacionais para a garantia de direitos das pessoas com deficiência, como:
Integração
Escolas e classes especiais, onde estudantes com deficiência estudam com colegas considerados seus iguais = diversidade subtraída e busca pela homogeneização.
Inclusão
Instituição se adapta e modifica, altera o ambiente para que todos transitem com autonomia e a equipe pedagógica varia seus recursos didáticos = participação de todos.
A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência dá sustentação teórica ao projeto “Portas abertas para a inclusão — Educação física inclusiva”, tanto para estabelecer seus objetivos e metodologia como para atualizar os cursistas nas questões legislativas. O documento reforça que a deficiência é resultante da interação das particularidades dos indivíduos com as barreiras existentes na sociedade. Para a igualdade de oportunidades existir, é fundamental que todos se envolvam no processo de identificação e eliminação dessas barreiras, e não na correção das características individuais.
O paradigma da inclusão é diferente do paradigma da integração. “Integrar” também pretende promover a participação da pessoa com deficiência na sociedade, porém limita-se a apontar o problema no indivíduo. Segundo esse paradigma, basta a sociedade estar disponível para o convívio, cabendo ao indivíduo se adaptar aos padrões existentes por meio do uso de auxílios, tecnologias assistivas, intervenções médicas e outros métodos.
Na educação, a integração existe, por exemplo, quando um educador não modifica sua forma de dar aula nem a gestão da escola busca alternativas para receber estudantes com deficiência. Nesse cenário, espera-se que o aluno se adapte ao ambiente, e algumas das cenas de vivências na escola consideradas absolutamente naturais são: um estudante cadeirante terá que ser carregado pelas escadas do prédio; um aluno cego terá que pedir ajuda aos colegas ou ter um auxiliar para descrever as imagens utilizadas pelo professor; um estudante com deficiência intelectual será seguidamente reprovado de ano por não apreender o conteúdo dado. Nesse modelo, a educação será mais frequentemente oferecida em escolas ou classes especiais, onde estudantes com deficiência estudam com seus “iguais”, ou seja, a diversidade é subtraída e busca-se uma homogeneização.
Então, como tornar uma escola realmente inclusiva? Primeiramente, é preciso ter claro que a escola é corresponsável pelo sucesso ou fracasso de seus alunos . Para chegar a esse modelo, portanto, a escola precisa modificar-se em vez de esperar que o estudante se adapte . Nesse caso, a instituição altera o ambiente para que todos possam transitar autonomamente. Alguns eixos que podem ser trabalhados por educadores são:
• A equipe pedagógica pode variar os recursos didáticos de forma que todos possam participar.
No caso de um aluno cego, por exemplo, o educador deve disponibilizar os conteúdos abordados em braile ou em formato digital, utilizar materiais concretos para ajudar na assimilação de conceitos abstratos e planejar suas aulas de forma a descrever, ele mesmo, as imagens que utilizará, além de ler em voz alta conteúdos exibidos em apresentações;
• As avaliações individualizadas buscam entender o processo de aprendizagem de cada pessoa;
• O gestor pode propiciar espaços coletivos para discussões efetivas entre os professores com a participação de coordenadores e diretores. Maria Alice de Souza, coordenadora pedagógica em Fortaleza (Ceará), é um exemplo de como o gestor pode fazer articulações internas entre os próprios educadores para realização de projetos interdisciplinares: “Enquanto coordenadora pedagógica, achei que seria interessante envolver todos os professores da escola no musical planejando atividades interdisciplinares sobre o tema, como a produção de quadrinhos e dobraduras. Uma forma também de instigar os alunos a querer participar da dança”;
• O gestor pode fazer ainda articulações para que os projetos alcancem mais pessoas, como aconteceu em Porto Alegre (Rio Grande do Sul). Na capital gaúcha, três instituições diferentes se uniram para criar espaços inclusivos a partir da educação física, como pode ser visto mais detalhadamente no capítulo Na prática, subcapítulo de Parcerias
Por essas razões, o “Portas abertas” atua com o paradigma da inclusão por percebê-lo como uma perspectiva necessária à promoção da igualdade de direitos das pessoas com deficiência. As cursistas Janne Viterbo, Francisca Adília e Ana Patrícia, do Rio de Janeiro, capital, mandam o recado em seu trabalho final: “Quando a gente muda o foco da dificuldade para a potencialidade, tudo muda. Essa é a grande sacada da educação inclusiva”.
Os princípios da educação inclusiva são direcionadores e evidências de um amadurecimento histórico internacional sobre os direitos básicos e as políticas para que as pessoas com deficiência tenham de fato a autonomia garantida. Os documentos oficiais traçam parâmetros que servem como balizadores do movimento mundial tendo como base as mobilizações e as conquistas da sociedade civil. Rodrigo Hübner Mendes, superintendente do IRM, reforça: “São princípios que direcionam um amadurecimento histórico, e esse é o grande papel desses acordos: propiciar condições coerentes desse amadurecimento”.
O acesso à educação de qualidade está ligado ao entendimento dos direitos dessa parte da população. Os princípios e as dimensões que foram sendo fortificadas por meio dos documentos servem como um guia para o desenvolvimento de experiências educacionais inclusivas e foram utilizados como base conceitual para a concepção didática do curso de formação do “Portas abertas”. São eles:
Toda pessoa tem o direito de acesso à educação de qualidade na escola comum e a atendimento especializado complementar, de acordo com suas especificidades.
Toda pessoa aprende: sejam quais forem as particularidades intelectuais, sensoriais e físicas do educando, todos têm potencial de aprender e ensinar; é papel da comunidade escolar desenvolver estratégias pedagógicas que favoreçam a criação de vínculos afetivos, relações de troca e a aquisição de conhecimento.
O processo de aprendizagem de cada pessoa é singular: as necessidades educacionais de cada educando são únicas e devem ser atendidas por meio de estratégias pedagógicas e processos de avaliação diversificados.
O convívio no ambiente escolar comum beneficia todos: a interação com as diferenças humanas é fundamental para o desenvolvimento de qualquer um, à medida que amplia a percepção dos educandos sobre pluralidade, estimula sua empatia e favorece suas competências intelectuais.
A educação inclusiva diz respeito a todos: a educação inclusiva, orientada pelo direito à igualdade e o respeito às diferenças, deve considerar não somente as pessoas tradicionalmente excluídas mas todos os educandos, educadores, famílias, gestores escolares, gestores públicos, parceiros etc.
A partir de uma metodologia inspirada nos “cases studies” da Universidade de Harvard, foram construídas dimensões de análise de fenômenos educacionais, mais notadamente das escolas, por serem instituições sociais legitimadas para a construção de conhecimento socialmente construído por nossa sociedade. Importante ressaltar que os aspectos históricos e territoriais foram considerados na confecção dessas dimensões. São elas: Políticas públicas, Gestão escolar, Estratégias pedagógicas, Famílias e Parcerias.
Esse modelo conceitual é uma ferramenta que dialoga com a complexidade do tema da educação inclusiva e busca contemplar seus diversos atores. É importante ressaltar que cada dimensão tem sua particularidade e, ao mesmo tempo, é interdependente das demais. Finalmente, na articulação dessas dimensões com os atores concretos da escola, busca-se entender como se dá a aprendizagem para apresentar a todas e todos não uma formulação universal ou uma receita pronta, mas sim uma possibilidade de atuação baseada numa experiência empírica que deverá ser ressignificada por cada educadora e educador que nela se inspirar.
Refere-se a todos os aspectos de criação e gestão de políticas públicas que se relacionam com a educação inclusiva em um determinado país ou território. Abrange as instâncias legislativa, executiva e judiciária, impactando o conjunto de leis, diretrizes e decisões judiciais que buscam concretizar o direito à educação inclusiva.
A Política Nacional de Educação Especial de 2008 trouxe novas concepções à atuação da educação especial em nossos sistemas de ensino. Nela, obteve-se um avanço bastante significativo a favor da inclusão escolar eliminando a diferenciação de atendimento aos alunos, incluindo esses estudantes em ambientes comuns de escolarização e não mais em classes e escolas especiais. Saiba mais no DIVERSA: //bit.ly/artigo-diferenciar-para-incluir.
Criado na Inglaterra pelos pesquisadores Booth e Ainscow, trata-se de um conjunto de materiais para apoiar a revisão na escola de aspectos, como atividades no pátio, salas de professores e salas de aulas, além de outros relacionados à inclusão nas comunidades e no entorno da unidade escolar. O objetivo é encorajar todos os funcionários, pais e responsáveis e crianças a contribuírem com um plano de desenvolvimento inclusivo e colocá-lo em prática.
Refere-se às diversas etapas de planejamento e desenvolvimento das atividades de direção de uma instituição de ensino. Abrange a construção dos Projetos político-pedagógicos (PPPs), a elaboração dos planos de ação, formação de professores, a gestão dos processos internos da instituição e suas relações com a comunidade.
Para a Política Nacional, a gestão da escola é responsável por organizar espaços e recursos para a inclusão (englobando o atendimento especializado), além de favorecer uma cultura de promoção da aprendizagem e da singularidade e valorização das diferenças. Já o Índex ressalta o papel da direção da escola e da equipe pedagógica em instaurar valores que são essenciais para possibilitar a inclusão tanto entre os educadores quanto com os demais funcionários. A gestão deve visar a uma educação democrática, comunitária, que promova a saúde e a cidadania e combata o preconceito
É necessária uma proposta pedagógica que atenda e atinja todos. Por isso, é preciso dar atenção às diversas etapas de planejamento e desenvolvimento das práticas voltadas ao ensino e à aprendizagem. Abrangem as atividades do ensino regular, as ações destinadas ao Atendimento educacional especializado e o processo de avaliação de todos os estudantes.
É a dimensão que foca as relações estabelecidas entre a escola e os familiares dos educandos. Ela abrange o envolvimento desse núcleo com o planejamento e o desenvolvimento das atividades escolares e contempla tanto as relações que favorecem a educação inclusiva como as situações de conflito e resistência.
O Índex sugere que a participação da família tenha como características o envolvimento e a aceitação de todos, a colaboração e o “estar juntos”, por meio de um engajamento ativo tanto na aprendizagem quanto nas tomadas de decisão, privilegiando o diálogo e a parceria entre os educadores e os familiares
Refere-se às relações estabelecidas entre a escola e os atores externos à instituição em que atuam para dar apoio aos processos de educação inclusiva. Tais atores podem ser pessoas físicas ou jurídicas e abrangem as áreas da saúde, da educação não formal, da assistência social e outras.
A formação oferecida pelo “Portas abertas para a inclusão — Educação física inclusiva” adota metodologia criada para promover e apoiar intervenções no ambiente escolar. Os participantes, reunidos em grupos de trabalho, são convidados a desenvolver um projeto local voltado à melhoria do atendimento dos estudantes com deficiência por meio de atividades relacionadas à educação física inclusiva. As etapas para a realização desses projetos são:
O início do processo acontece quando os cursistas do “Portas abertas” elaboram um diagnóstico do cenário atual de uma das instituições de ensino em que atuam para compreenderem melhor suas realidades. Nesse momento, eles verificam se os princípios e as dimensões da educação inclusiva estão sendo contemplados e se há dificuldades iniciais que podem ser solucionadas, dentre outros aspectos. A partir dessa análise inicial, conseguem traçar as barreiras existentes que prejudicam o processo de inclusão e os facilitadores para que a educação inclusiva envolva toda a comunidade escolar.
Para que a inclusão aconteça, é fundamental “identificar nas diferenças todos os direitos que lhes são pertinentes e, a partir daí, encontrar medidas específicas para o Estado e a sociedade diminuírem ou eliminarem as ‘restrições de participação’ (dificuldades ou incapacidades causadas pelos ambientes humano e físico contra as pessoas com deficiência)”, segundo o professor Romeu Sassaki3 .
As barreiras para a inclusão podem ser entendidas como qualquer característica do ambiente ou atitude humana “que impedem a plena e efetiva participação dessas pessoas na sociedade em igualdade de oportunidades com as demais pessoas”, segundo a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência criada pela ONU em 2006. No contexto educacional, é tudo aquilo que deve ser eliminado, modificado, substituído ou acrescentado a fim de que cada estudante possa aprender. Por outro lado, os facilitadores para a inclusão são as características ambientais ou atitudes que favorecem o trabalho de eliminação dessas barreiras, diminuem o tempo e os recursos necessários para tanto ou ajudam a promover boas práticas na educação.
A partir do diagnóstico da situação atual da escola com o levantamento de barreiras e facilitadores, os cursistas partem para a fase de elaboração do plano de ação. Dentre todas as barreiras levantadas, uma deve ser eleita como prioridade, considerando as necessidades da comunidade e da equipe e os recursos disponíveis. Ela orienta a elaboração do plano de ação, composto por um objetivo (resultado desejado) e estratégias (formas de buscar esse resultado).
Houve um refinamento pedagógico em todo o processo do curso. A cada ano, as aulas online são revistas e contam com especialistas de peso que tornam o conteúdo atual e muito conectado com as realidades nacionais. Em 2016, as aulas contaram com a participação internacional de David Rodrigues (pesquisador português e uma das maiores referências na área de educação inclusiva) e também com especialistas do próprio IRM, como Aline Santos, coordenadora do DIVERSA.
A criação de um novo ambiente virtual de aprendizagem (AVA) também foi destaque, uma vez que tornou a ferramenta da formação muito mais simples. O novo ambiente foi construído para que contasse com navegação e usabilidade que realmente incluíssem todos os cursistas, ou seja, acessível para pessoas com deficiência e intuitivo até mesmo para cursistas com pouca familiaridade com internet. A tecnologia permite que o usuário entenda em qual parte do site está e encontre facilmente a área que deseja explorar.
Na etapa de registro dos avanços dos projetos do grupo, por exemplo, o novo ambiente online consegue facilitar a introdução dos conteúdos do trabalho em poucos cliques. Luiz Henrique Conceição, coordenador do programa de formação, contou: “Isso permite que esses educadores participem mais e melhor. Não é só o pessoal com dificuldade em tecnologia. É todo mundo.”. Além disso, a nova tecnologia permitiu que a equipe de tutoria acompanhasse mais facilmente e com mais informações o desenvolvimento do projeto, as colaborações e as dificuldades de cada cursista.
O Instituto Rodrigo Mendes também criou quatro novas aulas específicas sobre ferramentas digitais. Aline Santos, por exemplo, apoiou as aulas sobre novas mídias, ferramentas digitais e acessibilidade de conteúdo. A especialista abordou questões sobre a construção coletiva de conhecimento na internet se apropriando de novas mídias, como o celular, e deu dicas práticas de acessibilidade — como tornar apresentações mais acessíveis, a importância de legendar e descrever fotos, a atenção ao tamanho das fontes e ao contraste de cores, entre outras.
Os tópicos a seguir apresentam uma análise detalhada dos impactos gerados pelo “Portas abertas para a inclusão — Educação física inclusiva”, usando as cinco dimensões da educação inclusiva como estrutura para a organização do texto. Em 2016, 119 projetos foram desenvolvidos pelos cursistas. A maior parte deles (71,4%) atuou na dimensão de Estratégias pedagógicas. Todas as 16 cidades beneficiadas pelo “Portas abertas” tiveram projetos com foco nessa frente. Foram iniciativas que possibilitaram para toda a comunidade escolar ações como circuitos lúdicos, jogos e brincadeiras, esportes adaptados e muito mais. No total, 25.580 estudantes foram beneficiados pelos projetos que trabalharam nessa dimensão.
Inovações com significado e que realmente transformam realidades são, muitas vezes, resultado do encontro de vontades e ações de tomadores de decisão com as vontades e ações de atores da sociedade civil. Um único gestor não consegue fazer esse tipo de mudança sozinho, assim como é muito difícil um só indivíduo criar uma solução que seja escalável e beneficie toda uma cidade, estado ou país. Apenas por meio do esforço conjunto de representantes das diversas esferas sociais, torna-se possível a construção de soluções capazes de propiciar avanços na garantia de direitos e na valorização das diferenças humanas.
Durante o “Portas abertas”, identificaram-se aprendizados e também avanços reais para que a questão da educação inclusiva nas escolas seja cada vez mais pauta das políticas públicas brasileiras. Lauren Marra, cursista de Belo Horizonte (MG), contou: “O projeto impactou e apontou fatores de sucesso para o melhor desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem, auxiliou a escola a estabelecer interlocuções com a comunidade, além de responsabilizar-se pela implementação das políticas educacionais do município”.
No Rio de Janeiro (RJ), a Escola Municipal Tasso da Silveira já tem experiência em educação inclusiva. Mesmo assim, os cursistas identificaram que era necessário garantir que as características e necessidades específicas de todos os educandos fossem consideradas e atendidas para aumentar ainda mais a qualidade pedagógica. Entre as diversas estratégias utilizadas para envolver ativamente estudantes, professores e funcionários, uma das que mais se destacaram foi a criação de um mural informativo que abordou as questões de inclusão na sociedade.
Para garantir a continuidade das ações inclusivas já desenvolvidas nas aulas de educação física e expandi-las para todos os alunos da instituição, a primeira estratégia foi trabalhar com os próprios estudantes. Eles realizaram pesquisas para encontrar informações sobre a legislação relativa ao direito das pessoas com deficiência e também sobre o cenário da inclusão na sociedade. O resultado foi um mural de colagens com reflexões sobre a inclusão e referências que passeavam de Charles Chaplin até Sócrates e Paulo Freire.
A partir do resultado das pesquisas, que trouxeram os direitos das pessoas com deficiência no trabalho e números oficiais e estatísticos sobre o tema no Brasil, pôde-se trabalhar a questão da inclusão como política pública. O trabalho permitiu um acesso a dados e informações relevantes sobre o tema de maneira simples e interessante para toda a unidade escolar. O trabalho — que pode ser considerado parte da dimensão de gestão escolar, uma vez que se trata da gestão de conhecimento dentro da escola — tem forte influência na dimensão de Políticas públicas por se tornar uma ferramenta que traz questões macro (como estatísticas, índices e leis) para o cotidiano escolar, garantindo o acesso à informação e uma possibilidade de conscientização de toda a comunidade.
O projeto pode ser visto por pessoas que não fazem parte da comunidade escolar, pois a Escola Municipal Tasso da Silveira é um dos locais de votação do município. Durante os dois turnos das eleições municipais, o mural chamou atenção dos eleitores, multiplicando seu objetivo. A usuária da unidade escolar como eleitora Carolina Sampaio contou: “Quando fui votar, fiquei positivamente surpresa com cartazes expondo pensamento crítico sobre inclusão e sobre aceitação do diferente desenvolvidos em uma escola”.
Em Porto Alegre (RS), a parceria do “Portas abertas” é realizada com a Secretaria Municipal de Esportes. Em um dos grupos, em vez de a escola ser o cenário para a educação física inclusiva, uma articulação entre três organizações possibilitou o trabalho com a temática da inclusão a partir do esporte, indo além dos muros escolares. O Parque Ramiro Souto e o Ginásio Lupi Martins (unidades da Secretaria Municipal de Esporte, Recreação e Lazer), o IPDAE (Instituto Popular de Arte-Educação, uma entidade sem fins econômicos, situada na periferia da cidade) foram unidos em um projeto local de intervenção. No diagnóstico desses espaços, identificou-se a necessidade de formação de profissionais e usuários das instituições envolvidas sobre o tema inclusão
Para aproximar o público-alvo do tema, o grupo buscou sensibilizar os participantes dos locais envolvidos para o acolhimento das diferenças mediante reflexão dos princípios da autoconsciência, empatia e entendimento da nossa relação com o mundo, presentes no livro Triplo Foco, de Daniel Goleman e Peter Senge (Editora Objetiva, 2016). Para isso, foram utilizados jogos, brincadeiras e oficinas musicais. No final do projeto, o grupo deu um depoimento sobre a importância dessa estratégia para o sucesso do trabalho: “Por meio da relação entre os grupos, das reflexões e atividades de sensibilização dos princípios que nortearam nossa proposta, foi possível semear uma visão de mundo mais inclusiva. O que nos motivou a realizar o trabalho nos três locais foi justamente a possibilidade de que, ao refletirmos sobre a importância da inclusão, nossos alunos pudessem aderir à proposta e tornarem-se multiplicadores dessa ideia.”
O evento “Brincando de Incluir” firmou a conclusão do projeto dos cursistas gaúchos com a presença de 140 pessoas. Nesse dia, 12 monitores das instituições participantes realizaram oficinas de artes plásticas e música, atividades recreativas (como cama elástica, piscina de bolinhas) e atividades esportivas inclusivas nas modalidades vôlei, judô, futebol e basquete. Também foram realizadas atividades de sensibilização e integração de todos os envolvidos.
Os resultados do evento final do projeto dos cursistas do “Portas abertas” trouxeram efeitos concretos diretos. Rodrigo Carreño, coordenador do Ginásio Lupi Martins, participou do “Brincando de Incluir” e já abriu o espaço para que os cursistas possam planejar os eventos da instituição de maneira inclusiva. Ele também estuda a possibilidade de garantir pelo menos um dia de encontros de ginástica para adultos e idosos e de judô para a criação de atividades diferenciadas, contando com a experiência de convidados e de pessoas com deficiência. Os cursistas reforçaram: “Essa proposta abre um espaço para divulgação mais ampla na comunidade e arredores e desafia os professores a pensarem e efetivarem a inclusão. Entendemos que esse é um caminho possível para que o Ginásio Lupi Martins acolha e trabalhe com alunos com deficiência”.
A gestão da escola tem papel fundamental no processo de inclusão dos estudantes com deficiência e da valorização das diferenças na comunidade escolar. Cursistas do “Portas abertas” de dez cidades criaram 19 projetos que trabalhavam com a dimensão da gestão escolar em suas instituições a partir de formações, desenvolvimento e melhoria dos PPPs, ações esportivas inclusivas e muito mais. Em 2016, 5.304 pessoas foram impactadas por projetos que atuaram nessa dimensão.
A importância do gestor é evidente na valorização da educação inclusiva e dos profissionais da área e também das possibilidades de articulação entre as equipes da escola e de fora da instituição. Rita de Cássia Rodrigues, cursista de Belém (PA), contou: “O projeto teve a participação da coordenadora pedagógica, o que ampliou seu olhar sobre a importância de voltarmos nossa atenção para a inclusão, mais especificamente para as necessidades dos nossos alunos como indivíduos”.
Nos depoimentos dos educadores que participaram do “Portas Abertas”, foram apontadas questões importantes que passaram a ser mais sensíveis no cotidiano de alguns gestores escolares após o curso:
• mudança no modo de gestão, proporcionando maior integração com alunos, familiares e professores regentes e do AEE;
• mais atenção às questões relativas ao processo de educação inclusiva na escola, que resultaram muitas vezes em melhorias no PPP;
• criação de modelos de gestão mais democráticos, que permitem o fortalecimento do vínculo com a comunidade;
• estabelecimento de momentos de formação continuada com foco na inclusão, como destaca Sandra da Silva, cursista de Belford Roxo (RJ): “Sou professora de AEE, e o curso ajudou-me a refletir sobre a importância da EF aos estudantes com deficiência, TGD e altas habilidades/superdotação e como estabelecer uma parceria com tais professores para o melhor desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem dos/das estudantes”;
• reconhecimento do trabalho dos educadores. Keitel Junior, cursista de Cuiabá (MT) contou: “Pelo fato de eu participar do projeto e ser o diretor, pude perceber a real necessidade de investir mais nos materiais necessários para a realização das atividades dos professores”. Isso também aconteceu em outras cidades do curso, como Natal (RN).
O Centro Municipal de Educação Infantil (CMEI) Argentina Barros, em Manaus (AM), vem recebendo desde 2013 cada vez mais estudantes com deficiência, principalmente pessoas com espectro do autismo, baixa visão e transtornos intelectuais. Segundo identificaram os cursistas, a partir das entrevistas com pedagogos, professores e secretárias da escola, é bastante provável que esse aumento nas matrículas esteja ligado à Lei 12.796, de 4 de abril de 2013, que estipula a obrigatoriedade da matrícula de crianças a partir dos 4 anos na educação infantil.
Partindo desse cenário, ao verificar o Projeto político-pedagógico (PPP) da escola, constataram que o documento não contemplava o tema da inclusão e não considerava a criação de ações que possibilitasse atender com qualidade os estudantes com deficiência. Os próprios participantes do “Portas abertas” ressaltaram: “O PPP tem o objetivo de nortear as metas de uma gestão democrática e participativa entre docentes, discentes e as parcerias com a comunidade onde a escola está inserida. Portanto, se o PPP não contempla essa questão, se torna uma barreira relevante a ser analisada e repensada dentro do que se espera de uma gestão democrática que vise à inclusão de forma geral”.
Os desafios no cotidiano da escola abrangiam dificuldades, como a dos professores em atender todas as crianças sem um professor auxiliar, figura que apoia a aplicação das atividades ou o atendimento das necessidades peculiares de cada estudante. De acordo com a lei, a presença obrigatória desse profissional depende das especificidades da(s) criança(s) com deficiência presente(s) na turma. Caso nenhuma delas tenha a necessidade específica de contar com tal apoio, é responsabilidade do professor atender a todas as crianças, com suas particularidades.
Constatou-se assim que era preciso realizar uma formação dos professores da instituição para práticas pedagógicas que promovesse o desenvolvimento cognitivo e físico das crianças com deficiência. Para haver inclusão, essas práticas precisam respeitar as especificidades de cada um, com ou sem deficiência, promovendo o pleno desenvolvimento de todos.
Na Escola Municipal Radialista Edécio Lopes, localizada na periferia de Maceió (AL), os educadores encontravam enormes desafios na área da educação especial e sentiam-se inseguros na sua prática pedagógica. A partir disso, os cursistas do “Portas abertas” decidiram proporcionar uma formação para compreensão conceitual e prática da inclusão que abrangesse todo o corpo docente, inclusive os educadores do Atendimento educacional especializado (AEE), a equipe gestora e a coordenação pedagógica.
Um encontro foi realizado com professores de aula regular e AEEs, bibliotecárias, coordenadoras e com a vice-diretora. Nele, foi possível introduzir o tema e destacar a realidade daqueles educadores a partir da escuta de depoimentos. Também foi realizada uma oficina que apresentou uma série de jogos que podem ser utilizados para facilitar a prática educacional em sala de aula, como o uso do dominó colorido e do quebra-cabeça de E.V.A, uma espécie de espuma emborrachada.
Segundo as cursistas, o uso de brincadeiras garantiu que o encontro fosse além das expectativas. Elizabeth Laffitte, cursista de Maceió, reforçou: “Mesmo a gestão escolar sendo aberta à inclusão e compreendendo a importância do aprofundamento, esse passo de vivenciarmos na prática a formação na escola ainda não tinha acontecido. Com o encontro, abriu-se uma nova possibilidade de conhecer e aprofundar essas questões”.
O “Portas abertas” possibilitou a criação de novos caminhos educacionais para que estudantes com deficiência participassem ativamente das aulas de educação física e fossem realmente incluídos na rotina escolar. Isso porque, em 2016, foram 85 os projetos criados pelos cursistas com foco nas estratégias pedagógicas. Mais de 33 mil pessoas foram impactadas de alguma forma; sendo 1.846 estudantes público-alvo da educação especial.
As cursistas que atuaram na Escola Municipal Marconi, em Belo Horizonte (MG), identificaram que a metodologia dos professores de educação física não incluía rotineiramente os alunos com deficiência. A partir disso, levantou-se a necessidade de os profissionais conhecerem o quadro de alunos e as especificidades de cada um com antecedência. Assim seria possível aprimorar a prática pedagógica com a criação e a adaptação de jogos para otimizar o trabalho e ampliar a potencialidade dos alunos.
O projeto foi dividido em três frentes de trabalho. Em primeiro lugar, as cursistas observaram as estratégias até então utilizadas pelos professores de educação física. Em seguida, foram realizados eventos formativos que permitiram o levantamento e a análise dos alunos com deficiência e um estudo mais aprofundado sobre cada caso para a estruturação do projeto, reuniões com familiares para debates sobre o tema e um encontro entre os profissionais do Atendimento educacional especializado (AEE) e a direção da escola para garantir um apoio institucional ao projeto.
O resultado foi a criação de um circuito inclusivo. Nele, os estudantes passaram por uma série de desafios, incluindo uma corrida de equilíbrio com uma colher na boca e os olhos vendados. Liz Loyola, uma das estudantes que participaram da atividade junto com o colega Caio, com deficiência visual, comentou: “Eu achei o circuito muito legal porque fui dupla do Caio, a gente sentiu como é a vida para ele, o lado deles também [outros colegas com deficiência]”. Gleiciane, outra estudante, completou: “O Caio pode ser cego, mas a dificuldade durante o circuito era mais nossa. Para ele, era muito mais fácil fazer os desafios, como correr, do que para nós”.
Em Belford Roxo (RJ), um grupo de cursistas colocou como meta fazer com que os alunos do 5° ano do ensino fundamental da Escola Municipal Jorge Ayres participassem da educação física na perspectiva inclusiva. Para isso, utilizaram a estratégia pedagógica da progressão das atividades a partir de jogos adaptados, com o câmbio e o voleibol sentados.
Os cursistas ressaltaram no relatório final: “Após a realização da nossa primeira aula prática, percebemos que os alunos tiveram muita dificuldade em dar prosseguimento às jogadas, devido ao grau de dificuldade exigido pelo voleibol”. A partir dessa tentativa, a estratégia da progressão continuada fez com que o grupo iniciasse com a atividade pré-desportiva do câmbio sentado até conseguir praticar o voleibol sentado. E quem participou, como o estudante Gabriel Lucas, que faz parte do público-alvo da educação especial na escola, reforçou: “Acredite no esporte! O esporte é uma coisa maravilhosa”.
Foi criada uma estratégia de ação baseada em três fases para se conseguir alcançar resultados bem-sucedidos. Em um primeiro momento, houve um esforço para a conscientização da comunidade e envolvimento de alunos, educadores e gestores no processo. Em seguida, foi organizado um planejamento conjunto dos professores de educação física. O aumento do diálogo entre os educadores garantiu que a proposta de inclusão para todos os alunos da escola fosse colocada em prática.
A partir do apoio da comunidade escolar, os professores de educação física iniciaram um trabalho de flexibilização das atividades motoras. Os educadores analisaram as capacidades de cada aluno para realizar os principais fundamentos do voleibol (saque, toque e manchete) e fizeram algumas adaptações, como mudar a bola de voleibol oficial para um bolão e fazer o rodízio de saque sem precisar sair do lugar.
Em São Luís (MA), os cursistas da Unidade de Educação Básica (UEB) Rubem Almeida encontraram um cenário com professores pouco comprometidos com a causa da inclusão na educação e a falta de planejamento pedagógico no segmento. Para superar essas e outras barreiras, os cursistas buscaram democratizar a prática da ginástica rítmica para os alunos do 6º ano como alternativa para inclusão interpessoal e social.
Cerca de 40 estudantes puderam ter a oportunidade de trabalhar com os movimentos corporais da ginástica rítmica de maneira inclusiva, e o grupo se demonstrou mais unido ao final do projeto. Gabriele, aluna da UEB Rubem Almeida, contou: “Antes eu achava que essas crianças com deficiência não conseguiam fazer nada, que elas precisavam de ajuda pra tudo. Depois desse projeto, eu percebi que não é nada disso. Eles podem fazer muitas coisas. Até coisas que eu não consigo fazer. Eu aprendi que todos nós temos muito a aprender uns com os outros”.
O projeto surpreendeu os próprios professores da instituição. Jocilene Nascimento, professora de educação física, contou: “A possibilidade de adaptação da ginástica rítmica fez com que eu me superasse como professora. Quando era atleta, via a ginástica rítmica como um esporte aplicado para superatletas. Era algo competitivo, quem estica mais a perna, quem alonga, quem dá o salto maior”. Jocilene foi pentacampeã maranhense de ginástica rítmica e pretende trazer a seleção maranhense de ginástica para dar uma oficina às crianças em 2017 usando os materiais oficiais. Outro plano é levar os estudantes à sede da equipe. A estudante Ingride Machado contou: “Amei participar e não quero parar tão cedo. Aqui ninguém tem dificuldade em fazer ginástica rítmica. Todos mostram que são capazes. Os estudantes com deficiência fazem coisas que deixam a gente de boca aberta. Muitos chegam com muita vergonha, mas acabaram se soltando”.
Na Coletânea de Práticas rm.org.br/portas-abertas, também é possível conhecer um projeto realizado em Fortaleza (CE), que decidiu usar a dança como estratégia para o trabalho com a inclusão. Os cursistas apontaram que um ambiente escolar voltado à dança é um lugar de socialização do conhecimento e de fortificação das relações sociais. Sobre esse projeto, Luiz Henrique Conceição, coordenador do IRM, reforçou: “O mais interessante é o caráter interdisciplinar desse projeto. Não é esperado, no censo comum, que aulas de educação física desenvolvam musicais. A professora abriu diálogo com outros educadores, como com a área de artes, para a construção do material”. O coordenador também apontou para a importância de os estudantes com deficiência estarem atuando em todas as frentes de ação: “Eles eram o que queriam ser. Isso que é inclusão. Os estudantes com deficiência não foram só os personagens principais; eles puderam participar da maneira como desejassem”.
O “Portas abertas” reforça o conceito de familiares como grandes aliados dos professores, dos gestores e da escola como um todo. Depoimentos de cursistas apontam que a parceria entre escola e família impede a evasão escolar e aumenta a frequência dos estudantes, cria e fortalece a relação de confiança dos familiares com os educadores e melhora a percepção das possibilidades de participação de crianças com deficiência. Os projetos realizados pelos cursistas do “Portas abertas” não beneficiam apenas os familiares dos estudantes com deficiência, mas todas as famílias das escolas impactadas.
Ao trabalhar com a dimensão Família, muitos cursistas foram sensibilizados sobre a questão da inclusão a partir de vivências pessoais. Bianca Parreira, cursista de Belo Horizonte (MG), compartilhou: “Tive recentemente um filho com Síndrome de Down. O ‘Portas abertas’ me ajudou a refletir, como mãe e como profissional, o quanto ainda temos que avançar nessa área. Me fez perceber que cada indivíduo tem o seu tempo de aprendizagem e que devemos diversificar as atividades em sala para atender um maior número de alunos”.
Em 2016 foram realizados oito projetos com foco nas famílias, impactando 1.781 pessoas. Se considerarmos os projetos que trabalharam nessa e nas demais dimensões, 7.254 familiares foram impactados durante o ano de 2016.
“As famílias puderam ver que as suas crianças com deficiência também podem participar das aulas de educação física e até mesmo praticar um esporte, que a deficiência pode ser uma limitação, mas não uma impossibilidade.” Carolina Nascimento, cursista de Belford Roxo (RJ)
“Alguns pais passaram a participar de forma mais efetiva na vida escolar das crianças e também se interessaram em levar para suas casas a ideia do uso de material reciclado para construção de brinquedos e instrumentos para atividades físicas.” Adriana Nunes, cursista de Manaus (AM)
“Toda a escola tem que pensar a inclusão. E as experiências não podem ficar trancadas a sete chaves nas escolas. As pessoas precisam conhecer essas práticas e saber que é possível incluir.” Ivone Pulquério, integrante da secretaria municipal de educação de Cuiabá (MT)
Na Escola Municipal de Educação Básica (EMEB) Juarez Sodré Farias, em Cuiabá (MT), foram diagnosticadas como barreiras a falta de informação e a não aceitação da deficiência do estudante. A partir disso, os educadores da escola e cursistas do “Portas abertas” entenderam que era necessário “abrir e ampliar um espaço de diálogos e reflexões acerca das limitações individuais das crianças, entre a escola e a família, visando garantir um maior desenvolvimento e inclusão”.
Para atingir o objetivo, foram realizadas diversas ações para aproximar as famílias da unidade escolar a partir do tema da educação inclusiva. Vanilda Carvalho Mendes, facilitadora do “Portas abertas”, contou: “O projeto gerou uma união colaborativa. Antes os professores, gestores e coordenadores estavam separados. O projeto colocou todos juntos, uma união em prol dos estudantes”. Além disso, a cursista Ianai Fernanda Almeida reforçou que o projeto “aproximou as famílias da escola, o que favoreceu o diálogo e a percepção de possibilidades dos alunos com deficiência. A família se viu valorizada, pois os estudantes demonstraram satisfação e felicidade em estarem participando das ações.”
Juntos, cursistas, familiares e a equipe da escola realizaram ações como o “Sarau com prosa”, que permitiu momentos de conversas informais e informativas sobre inclusão, desenvolvimento, estratégias e experiências de sucesso. O grupo de cursistas também atuou durante Festa da Família. Celebração já típica da escola, em 2016 o evento contou com um momento de jogos sensoriais que permitiram que estudantes com e sem deficiência e suas famílias tivessem experiências diversificadas, juntos.
A educação vai muito além da sala de aula com carteiras. Ela deve estar em todos os lugares, ser acessível a todos e precisa desenvolver o ser humano integralmente — considerando as dimensões intelectual, física, emocional, social e cultural. Para que essas três metas sejam alcançadas, parcerias com organizações externas são fundamentais. As alianças estabelecidas entre a instituição de ensino e indivíduos ou organizações do entorno escolar garantem que a experiência e os conhecimentos coletivos enriqueçam as práticas pedagógicas e de gestão, beneficiando os estudantes.
Firmar parcerias não é tarefa fácil, e ter sucesso com elas é desafiador. Ainda assim, os cursistas de Belém (PA), Fortaleza (CE) e Salvador (BA) conseguiram beneficiar mais de 1.500 pessoas a partir de alianças com instituições do poder público, organizações privadas, outras escolas, profissionais da saúde para atendimentos específicos, profissionais de apoio e projetos da comunidade em que a escola está localizada.
No Recife (PE), o estudante com paraplegia Fernando de Melo, da Escola Municipal (EM) Antônio Heráclio do Rêgo, teve a oportunidade de levar a atividade física que pratica na comunidade onde mora para a escola, a partir de uma parceria com seus mestres de capoeira. O projeto resultou em uma roda de capoeira que teve como proposta principal trabalhar de maneira interativa a história, as músicas, os instrumentos, os benefícios, passes e jogos da capoeira. No relatório final, os cursistas compartilharam: ”Com a realização do trabalho, conseguimos despertar o sentimento de pertencimento por parte do estudante Fernando de Melo, sensibilizando toda a comunidade escolar para a inclusão”.
Diversos depoimentos de cursistas do “Portas abertas” apontaram para uma sensibilização da equipe gestora da escola nas questões de inclusão. O trabalho durante o curso resultou em ganhos, desde a visibilidade da necessidade da compra de materiais específicos até avanços na autonomia dos professores, na integração da equipe e na atuação dos próprios gestores nas ações voltadas para inclusão.
Os depoimentos dos educadores sobre os resultados do projeto apontam como o “Portas abertas” fortaleceu a aproximação entre os profissionais das escolas. A diretora e também cursista Claudia Cecilia Upton, de Belém (PA), ressaltou: “O ‘Portas abertas’ mostrou que não existem barreiras para a integração dos profissionais, e a realização de projetos de cunho cooperativo e interdisciplinar os aproxima e os envolve de maneira efetiva.
Percebemos também que a escola já vivencia o trabalho cooperativo e que é necessário um ‘fio condutor’, ou seja, um projeto, uma ação (planejada, executada e avaliada) que aproxime a equipe escolar na sua realização”. Com isso, mais trocas de experiências passaram a acontecer em prol da educação inclusiva e, consequentemente, a socialização, a aprendizagem e o desenvolvimento dos alunos com deficiência foram beneficiados.
Muitos cursistas também relataram avanços quando falamos sobre a aprendizagem dos estudantes nas escolas beneficiadas. Destacam-se três frentes principais que foram citadas em 2016, incluindo depoimentos de estudantes beneficiados pelo “Portas abertas”: avanços na socialização, aprendizagem e desenvolvimento motor dos alunos com deficiência.
Além do desenvolvimento motor e da inclusão dos alunos no ambiente escolar, o “Portas abertas” também trouxe avanços no desenvolvimento da autoconfiança dos alunos com deficiência e, como consequência, a valorização destes por toda a comunidade escolar e familiares. Segundo Francineide Barbosa, cursista de São Paulo (SP), “Pelo projeto foi possível resgatar a identidade desses alunos, tirando o foco da deficiência e possibilitando que muitos pais reconhecessem as potencialidades dos próprios filhos com deficiência.”
A felicidade dos estudantes em participar das atividades escolares e em conviver com amigos é notável em praticamente todos os depoimentos que os estudantes deram à equipe do projeto. Essa alegria também é convertida em aumento de interesse desses alunos pelas atividades da escola. Cursistas de Natal (RN) e Cuiabá (MT) reforçaram esse avanço em seus depoimentos
Em São Paulo, capital, o Centro Integrado de Educação de Jovens e Adultos (CIEJA) Aluna Jéssica Nunes Herculano atende os adolescentes a partir de 15 anos, jovens e adultos. Os estudantes do módulo 3, onde as aulas acontecem com um rodízio de disciplinas por áreas, não tinham aulas de educação física na grade curricular. A legislação que trata da educação física na Educação de Jovens e Adultos (EJA) prevê dispensa dessa disciplina ou indica que os alunos participem de atividades físicas no contraturno. No entanto, apesar da falta de espaço para que as práticas esportivas acontecessem no CIEJA, o projeto dos cursistas da escola teve como objetivo incluir as aulas de educação física na grade curricular dos estudantes.
“Apesar de sabermos que, para os alunos do módulo 3, fazer atividades na rua é uma barreira, pois ainda não estão acostumados com esse espaço, e a maioria dos alunos são jovens e sentem-se mais envergonhados em expor-se, a equipe escolar reconhece que a não participação nas aulas de educação física configura-se como exclusão. Portanto, ofertar essa disciplina a todos os estudantes é uma prioridade”, afirmaram os cursistas do CIEJA. Para eles, disponibilizar as aulas de educação física para todos é uma ação muito importante para maior disposição e maior qualidade de vida dos estudantes. A cursista Jacqueline Cristina Martins, professora de educação física contou: “O esporte não é só para as pessoas jovens, altas, fortes. É também para idosos, pessoas com deficiência... É para todo mundo”
Uma das primeiras coisas que chamam atenção no CIEJA Aluna Jéssica Nunes Herculano é o nome. Enquanto a maioria das escolas públicas homenageia políticos, professores, médicos, militares, artistas, entre outros, essa unidade educacional recebeu o nome de uma ex-aluna da instituição. Jéssica era uma jovem com Síndrome de Williams, que estudou e se formou ali. Após seu falecimento em 2010, a mãe da estudante, valorizando a importância que a escola teve na vida da Jéssica, procurou a Secretaria Municipal de Educação e solicitou que a escola recebesse o nome da filha.
A história é o gancho para destacar o diferencial da instituição em promover a inclusão. O período de aulas diárias é reduzido, com duração de 2h15 por turno. Com isso, é possível criar seis turnos de aulas nos três períodos do dia e garantir um número menor de alunos por sala. O objetivo é tanto atender adolescentes, jovens e adultos trabalhadores, levando em conta as diversas possibilidades de jornadas de trabalho, quanto proporcionar às mulheres que trabalham em casa, aos idosos e aos aposentados a oportunidade de estudar no período diurno.
Por diferentes motivos, essas pessoas não conseguem estudar durante as noites nas escolas que oferecem a EJA no formato convencional, que é um período noturno com 4 horas de duração. Na cidade de São Paulo, existem 15 CIEJAs, e cada um deles tem autonomia para a sua organização estrutural e curricular, tendo como base a legislação da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo.
As aulas dos módulos 1 e 2 são ministradas por pedagogas, o que possibilita aos estudantes ter aulas com a mesma professora durante todo o ano letivo. Já nos módulos 3 e 4, a organização é diferente, com disciplinas estabelecidas em forma de rodízio por áreas: ciências humanas (geografia e história), ciências da natureza e matemática e linguagens e códigos (artes, língua portuguesa, educação física e língua inglesa). Essa organização busca promover um currículo interdisciplinar que rompa com a fragmentação dos conhecimentos e que facilite a organização dos estudos desses jovens e adultos. Assim, por exemplo, a turma do módulo 4 inicia o ano com aulas na área de linguagens e códigos e permanece focada nessas áreas por trinta dias. Ao final desse período, a turma passa a assistir às aulas de uma nova área, e assim sucessivamente até o final do semestre.
No segundo semestre esse rodízio ocorre novamente, totalizando duas passagens em cada área de conhecimento ao longo do ano. Também são oferecidas diversas oficinas para capacitação dos estudantes para o mercado de trabalho. A iniciativa é considerada um exemplo na área de educação inclusiva, sendo citada como proposta curricular inovadora pela publicação da Cidade Escola Aprendiz: Escolas em Rede bit.ly/escolas-em-rede.
Nos cinco anos do projeto “Portas abertas”, só aumenta a convicção do Instituto Rodrigo Mendes, do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e da Fundação FC Barcelona de que é possível desconstruir a concepção conservadora de educação, ainda predominante em muitas instituições de ensino no Brasil e em outros países. Essa ruptura também acontece na educação física, disciplina historicamente marcada pela valorização do desempenho físico, da competição, de um ideal de corpo e, consequentemente, pela exclusão daqueles que não se enquadram em modelos idealizados de ser humano.
As ações desenvolvidas pelos cursistas do “Portas abertas” sinalizam caminhos para que a educação física seja ressignificada e concebida a partir de uma perspectiva que considere todas e todos. Mais do que isso: que a questão da inclusão extrapole as quadras e as salas de aula, sendo apropriada por toda a instituição de ensino e pela comunidade. Nesse sentido, o relatório deste projeto traz contribuições para o enfrentamento das barreiras existentes, favorecendo a inclusão de pessoas com deficiência na escola comum.
Como um dos resultados, pode-se apontar o êxito na utilização de atividades físicas para melhorar a convivência dos estudantes com e sem deficiência e ampliar a participação dessas crianças, jovens e adultos na vida escolar. Em 2016, 85 projetos tiveram como foco o trabalho com estratégias pedagógicas e, em muitos deles, os estudantes tornaram-se parte de sua construção e desenvolvimento, estimulando o protagonismo estudantil.
Surgiram novas atividades físicas e houve a ressignificação de esportes olímpicos e paralímpicos. Outros esportes foram adaptados para participação de todos os estudantes e extrapolaram os muros das escolas, envolvendo diversas instituições e também as comunidades do entorno, permitindo uma reflexão sobre a implementação da educação integral em algumas redes participantes.
Os resultados positivos da atuação dos cursistas do “Portas abertas” no cotidiano escolar demonstram como é importante a questão da formação continuada de educadores. Além do conhecimento ampliado, muitos cursistas que ocupam diferentes funções dentro da rede se tornaram mais atentos às questões das pessoas com deficiência tanto no âmbito escolar quanto na sociedade em geral. Isso permite que tais profissionais possam aperfeiçoar as políticas públicas educacionais e as formas de relacionamento dentro das unidades escolares em busca de uma participação mais ativa e democrática. Possibilita também a contribuição de todas e todos para o planejamento das atividades desenvolvidas na sala de aula, fomentando a construção de uma sociedade verdadeiramente inclusiva.
O projeto garantiu ainda avanços na construção de modelos de gestão mais democráticos, maior interação entre gestores escolares e melhorias nos Projetos político-pedagógicos (PPP) das escolas participantes. Os professores sentiram-se mais valorizados e motivados a iniciarem projetos, e os gestores, por sua vez, conseguiram compreender melhor a realidade dos educadores de suas equipes. No entanto, o desafio de adequar os PPPs continua presente. Criar um processo coletivo que mobilize e escute toda a comunidade escolar é uma ação complexa e com expectativas diversas de cada ator envolvido. Mesmo assim, o “Portas abertas” de 2016 conseguiu abordar essas questões para incluir o debate e intensificar as ações a favor da inclusão de pessoas com deficiência na escola.
A promoção de diálogos também garantiu importantes avanços na utilização de espaços públicos fora das unidades escolares para o trabalho com educação inclusiva, como ruas, praças e parques, reafirmando a necessidade de ocupação social desses espaços e possibilitando uma educação integrada com familiares e toda a comunidade do entorno. Percebe-se que parcerias externas são fundamentais para a potencialização das ações de educação inclusiva propostas pela unidade educacional. Apesar de essa dimensão ser quase sempre o maior desafio dentro dos projetos que os cursistas realizam no “Portas abertas”, algumas iniciativas demonstram como a realização de parcerias pode ser potente e colaborar para o desenvolvimento de estratégias pedagógicas que aproximam o estudante da escola.
Com base na análise dos impactos quantitativos e qualitativos apurados durante o “Portas abertas”, os projetos locais desenvolvidos pelos cursistas, como buscou-se demonstrar neste relatório, revelam caminhos para que a educação seja estruturada de forma inclusiva, a partir de uma perspectiva igualitária.
Por fim, merece destaque a importância da metodologia adotada na formação, parte fundamental deste projeto, segundo a qual os grupos deveriam elaborar um diagnóstico e propor um plano de ação. Essa abordagem mostrou-se bastante eficiente, transformadora e determinante para os resultados apresentados: 43.528 pessoas impactadas, dentre as quais 32.325 estudantes.
Estamos certos de que o legado deste projeto contribui para a missão do Instituto Rodrigo Mendes, do UNICEF e da Fundação FC Barcelona de colaborar para a construção de uma sociedade inclusiva por meio de uma concepção de educação em que todos usufruam das mesmas oportunidades de forma igualitária.
Nosso agradecimento às equipes das secretarias municipais das 16 cidades participantes e todas as 119 instituições onde foram desenvolvidos os projetos de 2016. Além dessas, aos seguintes parceiros:
Consulado Britânico em São Paulo
Fundação FC Barcelona
Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF)
Ministério da Educação
Ministério do Esporte
Museu do Futebol
Latam Airlines
Todos pela Educação
União Brasileiro-Israelita do Bem-Estar Social (Unibes)
Lembramos que os impactos apresentados por este relatório são frutos do esforço e do comprometimento das secretarias que colaboraram com o projeto, dos facilitadores e interlocutores do curso, dos especialistas que se dedicaram à realização das aulas e dos cursistas responsáveis por desenvolver os projetos locais em cada cidade participante.